Jogos Inteligentes
Muitas horas colado ao teclado do computador ou aos comandos das consolas, nos últimos meses, têm-me levado a perceber uma nítida evolução na inteligência (artificial) dos jogos. Adepto fanático do jogo online e socializante, já há casos em que o jogo – ou os personagens artificiais dele, melhor dizendo – respondem e/ou comportam-se de forma a colocar verdadeiros desafios ao jogador e, até, criar-lhe a sensação de vida própria. O sonho das máquinas inteligentes já vem de longe, da literatura.
Nos anos cinquenta, época dourada da ficção-científica, os computadores inteligentes fizeram as delícias dos leitores. Todos inferiam essa inteligência como humana, confundindo «data» com conhecimento ou a operação de um programa com o processo de decisão humana. Confusão certamente originada em John von Neumann, o pai dos computadores modernos, quando os definiu como «cérebros electrónicos», estabelecendo assim uma explícita analogia com o cérebro humano.
Na verdade, o computador é, sobretudo, um laboratório onde se desenvolvem novos modos de pensar sobre o pensamento. A exemplo, a compreensão de vários traços da inteligência tem sido enriquecida com a tentativa de descrever esses mesmos traços com o detalhe necessário à escrita de programas. A inteligência dos computadores foi inicialmente «jogada» nos programas de xadrez e gamão. Isto é, em programas em que o computador necessita de tomar uma decisão, neste caso a escolha, entre as muitas respostas possíveis, da hipótese que melhor corresponda a consecução dos fins (ganhar o jogo). O que rápidamente se descobriu foi que, ao contrário do jogador humano que define subestratégias (ganhar uma peça v.g.), a definição de objectivos intermédios em computação exigiria uma complexidade para já impossível de programar. Para ter uma ideia do que aqui está em causa basta esta conta simples: 35 é a média de jogadas que se podem fazer a partir de uma posição no tabuleiro, uma procura exaustiva de apenas três jogadas em avanço exige a examinação de mais de 1.8 biliões de jogadas!
É claro que os mestres de xadrez capazes de vencer um computador planeam com muito mais avanço, mas não ultrapassam, em média, a análise de cem jogadas. O critério que preside à escolha do mestre é muito selectivo, baseado nas subestratégias que desenvolveu e na experiência adquirida. Ao computador apenas resta uma análise objectiva -quantificada no valor das peças, do controlo do centro do tabuleiro, etc.- mas que tem que ser efectuada sobre todas as hipóteses possíveis, sem pré-selecção. Não estamos, no entanto, perante uma máquina estúpida, é bom recordar que normalmente os programas de xadrez jogam melhor que os seus programadores. Isto é, nem quem escreve os programas pode prêver como ele se irá comportar.
Um dos erros, ainda que seja admissível a classificação da inteligência artificial como uma disciplina da Psicologia Humana, é a definição de inteligência estritamente baseada nos processos humanos. Existe inteligência, ou pelo menos comportamentos inteligentes, para além do homem? A resposta parece ser afirmativa. Ou ter-se-á assim que aceitar, se queremos prosseguir esta investigação. Os jogos estão cada vez mais perto.
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